terça-feira, 24 de novembro de 2015

A PONTE DE ALCÂNTARA E A ESTÁTUA DE S. JOÃO NEPOMUCENO

A PONTE DE ALCÂNTARA E A ESTÁTUA DE S. JOÃO NEPOMUCENO

Alcântara no séc. XVII



O principal eixo viário para ocidente partia das portas de Santa Catarina para Belém, marginando sinuosamente o Tejo. Lisboa desenvolveu-se tentacular e organicamente ao longo desta via, ilustrado neste troço referente ao vale de Alcântara, com os seus campos de cultivo, enquadrados por extensos olivais e zonas baldias. A jusante, depois da ponte, o moinho de maré com a caldeira. Em direcção ao poente encontramos o largo do Calvário, com o Paço Real e anexos, os conventos das Flamengas e do Calvário,  a que se seguem o Palácio dos Condes de Sabugosa e a Quinta dos Saldanhas.

A ponte de Alcântara



Alcântara, bairro típico de Lisboa, deve   o   seu   nome à  existência de uma ponte   – alcântara    significa    “a ponte”    (al-qantara em árabe),   que atravessava   a   ribeira com   o mesmo  nome e que a Avenida de Ceuta cobriu.

A Ribeira   de Alcântara  tem  a sua  origem  na   Brandoa, concelho   da   Amadora, e corre   pelos   vales   da   Falagueira,   Benfica   e  Alcântara, percorrendo até ao Tejo, onde desagua, uma extensão total de cerca de dez quilómetros.

Entra em Lisboa nas   Portas   de Benfica   e   está   actualmente canalizada em toda a extensão da travessia    do   concelho de Lisboa. Os   trabalhos de canalização ficaram concluídos em 1967.

A   existência  da  ponte de Alcântara, inicialmente  de   madeira, é mencionada desde tempos   muito remotos. Foram os romanos, quando dominaram a Península  Ibérica, por volta do século III, que se lembraram de fazê-la de pedra, sólida  e maciça , como era seu costume, aproveitando a presença no local de  pedreiras calcárias.

Em 1727 a ponte media 90 m de comprimento e 6,20 m de largura. Com  o andar  dos tempos,  Alcântara viu crescer a sua  população   e o número de casas o que obrigou, em 1743 a alargar a  ponte de 6,20 m para 13,50 m.

Era a ponte formada   por   três   arcos    de    volta inteira com o tabuleiro horizontal.  O arco oriental, por desnecessário, foi entaipado talvez no século XVIII e o ocidental foi vedado nos meados do século XIX.

A Ponte de Alcântara,  ficava na junção das actuais ruas de Alcântara   e  do Prior do Crato (D. António), na direcção desta rua e perpendicularmente à linha férrea que vai da estação de Alcântara-Terra para a de Alcântara-Mar pelo leito da   Rua de João de Oliveira Miguéis.   As cancelas   da passagem   de nível  do caminho de ferro marcam   aproximadamente o vão do arco central  da ponte,  e os  muros divisórios do terreno do leito da via férrea marcam a largura da ponte.

Para o lado sul do local da ponte e das suas rampas de acesso   era  tudo    mar, que formava uma grande enseada, definida  a poente pelas actuais Ruas 1º de Maio e de Alcântara, e a nascente pela Rua do Prior do Crato e Travessa da Trabuqueta.

A guarda norte da ponte, já reduzida no seu comprimento a 33,7 m, foi demolida  por 1886 ou 1887, para a construção da estação de Alcântara da linha férrea de  Lisboa  a Sintra e Torres Vedras,  e ramal da Merceana.

A guarda sul, também já reduzida a 48,7 m de comprimento, desapareceu  em 1888, quando se cobriu o caneiro de Alcântara para  assentamento da via férrea que ligava a linha de Alcântara-Terra a Campolide com  a de Alcântara-Mar.

Com a demolição da guarda sul da ponte desapareceram os últimos vestígios da sua existência, e  quem  atravessa   hoje   da Rua do Prior para a Rua de Alcântara,  nem suspeita que   vai passando   por cima do arco de uma ponte, agora subterrado, que teve séculos de existência, e   que   foi   testemunha   de vários episódios guerreiros ocorridos na sua vizinhança.


A estátua de S. João Nepomuceno






































Sobre    o    lado    norte da ponte erigiu-se em 1743, uma estátua  em    mármore  de   S. João Nepomuceno,    protector dos navegantes, obra    do   escultor    italiano João António Bellini de Pádua. O escultor fora  salvo  de um naufrágio, atribuindo o milagre àquele santo,  “aplacador  dos mares” lhe   chama o artista devoto na legenda   latina do monumento.

As dimensões desta obra monumental,  são:

Plinto: 1,17 X 1,5 m de frente, e 2,65 m de altura; estátua com a sua base: 3,35 m de altura; altura total: 6m.




No plinto está esculpida, numa espécie de escudete ou sanefa talhada na cantaria, a inscrição em latim, cuja tradução é a seguinte:

A S. João Nepomuceno, novo taumaturgo do mundo, dominador da terra, do fogo, da água e do ar, e sobretudo aplacador dos mares, um seu devoto,  reconhecido para com o seu protector, ergueu esta estátua no ano de 1743 depois de salvo.

Foi esta estátua , benzida solenemente em 8 de Janeiro de 1744,  com a  presença da   rainha   D. Maria Ana de Áustria, mulher   de   D  . João V, acompanhada   dos príncipes.
   
Com as transformações  na zona de Alcântara no século XIX, a estátua acabou por ser retirada   em    1888, tendo   sido, por   ordem    da    Câmara    Municipal    de Lisboa, depositada no Museu Arqueológico do Carmo, onde presentemente se encontra.



Túmulo da Rainha D. Maria Ana de Áustria, mulher de D. João V, no Museu Arqueológico do Carmo.


A ponte de Alcântara na história de Portugal

No século XVI, a morte trágica de D. Sebastião, a 4  de Agosto de 1578, na batalha de Alcácer-Quibir, sem deixar filhos, originou uma crise  sucessória. Assumiram-se   três   principais  pretendentes ao trono  de Portugal: D. António, Prior do Crato, D. Catarina, duquesa de Bragança e Filipe II, Rei de Espanha.

Ficando  a   luta   pelo   trono   reduzida   a D. António, Prior   do Crato  e  a Filipe II de Espanha, o monarca castelhano determinou  a conquista   de Portugal pela via militar.

Foi no sítio de Alcântara, em 25 de Agosto de 1580,  junto à ponte velha, quando tudo eram campos, que se deu a batalha entre  D. António, Prior   do   Crato   e o Duque de Alba, que comandava as tropas de Filipe II, de Espanha.

Depois de duas tentativas falhadas, as tropas de Filipe II   acabaram   por derrotar as forças portuguesas, obrigando o Prior do Crato a recuar para Lisboa. Como resultado desta batalha, o   trono    de   Portugal   ficou  nas   mãos da dinastia   filipina durante  sessenta anos.

Marcando   este   acontecimento  histórico, em Janeiro  de 1923, foi dado o nome de Prior do Crato à antiga Rua Direita do Livramento.


Pinto Soares